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Um Pecado Sutil

Jabesmar A. Guimarães

Hoje vou escrever sobre um assunto que tem sido pouco tratado nas igrejas locais. Talvez alguns nem mesmo o achem apropriado para uma publicação como esta. Vou escrever sobre um pecado que, para muitos, é o centro da moral cristã. Não me refiro a moral sexual, apesar de que muitos o têm como o centro da moral cristã.

O pecado do qual trataremos é um pecado muito detestado nos outros e, ao mesmo tempo, bastante tolerado em nós mesmos. A maioria das pessoas admitem ter mau gênio, ter pavio curto, ter dificuldades com pensamentos impuros, ter dificuldades com a língua etc., mas poucos admitem ter problema com o pecado que trataremos.

Hoje pensaremos um pouco sobre o pecado do orgulho e seus sinônimos. Os antigos mestres cristãos o tratavam como o pior dos pecados, o supremo mal. C S Lewis disse:

“O que precisamos ver claramente é que o orgulho é essencialmente competidor; é competidor por sua própria natureza… O orgulho não sente prazer em possuir algo, mas apenas em possuir mais do que o próximo. …Enquanto existir no mundo alguém mais poderoso, ou mais rico, ou mais inteligente de quem seja orgulhoso, esse será seu rival e inimigo. …o orgulho tem sido a principal causa da miséria em todas as nações e em todas as famílias desde que o mundo é mundo. É terrível que o pior dos pecados possa penetrar sorrateiramente até atingir bem o centro da nossa vida espiritual.”

Portanto, vamos estudar um pouco sobre o ORGULHO, o qual provavelmente é o mais sutil dos pecados, pois surge no nosso próprio coração. Ou seja, quase nunca é motivado por fatores externos.

Vejamos algumas definições dadas ao termo orgulho:

Dicionário Online de Português:

s.m. Elevado conceito que alguém faz de si próprio. Amor-próprio exagerado. Brio. Altivez, soberba. Ufania.

Dicionário do Aurélio:

s.m. Sentimento de dignidade pessoal; brio, altivez. Amor-próprio demasiado; soberba. Aquilo ou aquele(s) de que(m) se tem orgulho.

O termo orgulho tem muitos sinônimos. Vejamos alguns: soberba, altivez, arrogância, exibicionismo, ostentação, pedantismo, pernosticidade, presunção, vaidade, vanglória.

Você já parou pra pensar onde surgiu o orgulho? Em quem foi o primeiro orgulhoso em todo o universo? Podemos afirmar, sem medo de errar, que o orgulho surgiu no coração de Satanás. Foi o orgulho que fez brotar no coração dele o sentimento de que não estava certo Deus ser mais elevado, mais majestoso, mais sublime, mais glorioso, mais poderoso que ele. “Foi pelo orgulho que Lúcifer se tornou um demônio” (CS Lewis).

Leiamos algumas coisas que o livro de Provérbios fala acerca deste pecado:

“Eu odeio o orgulho e a falta de modéstia, os maus caminhos e as palavras falsas” (8:13).

“Em vindo a soberba, sobrevém a desonra” (11:2).

“Da soberba só resulta a contenda” (13:10).

“Abominável é ao SENHOR todo arrogante de coração; é evidente que não ficará impune” (16:5).

“A soberba precede a ruína, e a altivez do espírito, a queda.” (16:18). Outra versão diz: “A desgraça está a um passo do orgulho; logo depois da vaidade vem a queda”

“Quanto ao soberbo e presumido, zombador é seu nome; procede com indignação e arrogância” (21:24).

“A soberba do homem o abaterá,…” (29:23).

No Antigo testamento podemos ver dois casos de extremo orgulho e soberba humana.

O primeiro caso se deu com o Faraó Ofra que governou o Egito por 19 anos, de 589 a 570 a.C, e que foi contemporâneo do profeta Ezequiel. Sua soberba o levou a dizer o seguinte acerca do Rio Nilo: “O meu rio é meu, e eu o fiz para mim mesmo” (Ez 29:3). Ora o Nilo tem 6.671 quilômetros e certamente ele nem disso sabia! Como então poderia tê-lo criado?

A pesada resposta do Senhor ao orgulho Faraó Ofra foi a seguinte: “Filho do homem, vire o seu rosto contra o faraó, rei do Egito, e profetize contra ele e contra todo o Egito” (Ez 29.2).

“Estou contra você, faraó, rei do Egito, contra você, grande monstro deitado em meio a seus riachos [o delta do Nilo] […] Deixarei você no deserto, você e todos os peixes dos seus regatos […] Você cairá em campo aberto e não será recolhido nem sepultado. Darei você como comida aos animais selvagens e às aves do céu […] Tornarei o Egito uma desgraça e um deserto arrasado desde Migdol [ao norte] até Sevene [ao sul], chegando até a fronteira com a Etiópia […] Nenhum pé de homem ou pata de animal o atravessará: ninguém morará ali por quarenta anos […] Espalharei os egípcios entre as nações e os dispersarei entre os povos […] Então todos os que vivem no Egito saberão que eu sou o Senhor” (Ez 29.1-12).

“Ao fim dos 40 anos [número certamente simbólico] ajuntarei os egípcios [Hofra já teria morrido e sido substituído] dentre as nações nas quais foram espalhados. Eu os trarei de volta do cativeiro e os farei voltar ao Alto Egito, à terra de seus antepassados. “Ali serão um reino humilde. Será o mais humilde dos reinos e nunca se exultará sobre outras nações” (Ez 29.13-15 – negrito meu).

O outro personagem é o bem conhecido Nabucodonozor que reinou na Babilônia por 43 anos (605 a 526 a.C.). Ele era muito poderoso e tornou-se extremamente orgulhoso. Ele se deu mal quando se auto-elogiou ao dizer: “Como é grande a cidade de Babilônia! Com o “meu” grande poder eu a construí para ser a capital do “meu” reino, a fim de mostrar a todos a “minha” grandeza e a “minha” glória”. Ele ainda estava se exaltando sobre tudo e todos quando Deus lhe disse: “Sua autoridade real lhe foi tirada [e] você será expulso do meio dos homens, viverá com os animais selvagens e comerá capim como os bois” (Dn 4.30).

Os que conhecem a história sabem que imediatamente o reio perdeu a noção e passou a comer capim com os bois e dormir ao relento. Viveu assim por sete longos anos. Depois deste tratamento de choque parece que ele ficou curado de sua soberba e arrogância. Agora suas palavras são: “Mas ao fim daqueles dias, eu, Nabucodonosor, levantei os olhos ao céu, tornou-me a vir o entendimento, e eu bendisse o Altíssimo, e louvei, e glorifiquei ao que vive para sempre, cujo domínio é sempiterno, e cujo reino é de geração em geração” (Dn 4:34). “Agora, pois, eu, Nabucodonosor, louvo, exalço e glorifico ao Rei do céu, porque todas as suas obras são verdadeiras, e os seus caminhos, justos, e pode humilhar aos que andam na soberba” (Dn 4:37).

Como pudemos ver o tratamento de choque pelo qual Faraó, o Egito e Nabucodonosor passaram surtiu um bom resultado. Às vezes precisamos ser quebrantados para aprendermos a ser humildes, mas não precisa ser assim. Se buscarmos ser humildes Deus não precisará tratar conosco.

Agora vejamos alguns textos do NT onde o orgulho é citado e o significado da palavra grega usada.

fronevw – [phroneō] Rm 11:20  à literalmente aqui: “não pensando nas coisas altas”.

“Pela sua incredulidade, foram quebrados; tu, porém, mediante a fé, estás firme. Não te ensoberbeças, mas teme.”

ujperfronevw – [hyperphroneō] (*Rm 12:3) à pensar alto demais acerca de si mesmo, ser altivo, arrogante.

“Porque, pela graça que me foi dada, digo a cada um dentre vós que não pense de si mesmo além do que convém; antes, pense com moderação, segundo a medida da fé que Deus repartiu a cada um.”

ajlazwn – [alazōn] (Rm 1:30; 2 Tm 3:2) à orgulhosos, pedante, jactancioso. Presunçoso, alguém que se vangloria e faz falsas promessas, frequentemente a fim de ter algum lucro.

“caluniadores, aborrecidos de Deus, insolentes (uJbis)soberbos (huperephanos)presunçosos (alazōn), inventores de males, desobedientes aos pais” (Rm 1:30).

“pois os homens serão egoístas, avarentos, jactanciosos, arrogantes, blasfemadores, desobedientes aos pais, ingratos, irreverentes” (2 Tm 3:2).

fronou’nte” [phronouvtes] part. pres. at. de uJyhlov” [hypselos] (Rm 12:16) à alto, exaltado, altivo, orgulhoso

“Tende o mesmo sentimento uns para com os outros; em lugar de serdes orgulhosos, condescendei com o que é humilde; não sejais sábios aos vossos próprios olhos.”

fusivwsi” – [physiōsis] (*2 Co 12:20) à arrogância, orgulho, insolência

“Temo, pois, que, indo ter convosco, não vos encontre na forma em que vos quero, e que também vós me acheis diferente do que esperáveis, e que haja entre vós contendas, invejas, iras, porfias, detrações, intrigas, orgulho e tumultos.”

ujyhlofronevw – hypsēlophroneō (*1 Tm 6:17) à ser orgulhoso, arrogante, altivo

“Exorta aos ricos do presente século que não sejam orgulhosos, nem depositem a sua esperança na instabilidade da riqueza, mas em Deus, que tudo nos proporciona ricamente para nosso aprazimento”.

ujperhvfano” – hyperēphanos (*Lc 1:51; Rm 1:30, 2 Tm 3:2; Tg 4:6; 1 Pe 5:5) à arrogante, altivo, orgulhoso. “Alguém que se julga acima dos outros. É a pessoa orgulhosa, insolente e autossuficiente que, em seu coração, coloca-se num pedestal acima de todos os outros, inclusive acima de Deus” (Trench, Synonyms – NDITNT).

Há ainda o que talvez seja a forma mais perniciosa do orgulho que é o orgulho da humildade. É aquela pessoa que faz questão de mostrar como ela é humilde. Está sempre dizendo que é o menorzinho dentre os irmãos, que é tão humilde, tão simples, que é um coitadinho etc. A Palavra nos alerta quanto a isto. Leiamos Colossenses 2:23à “Tais coisas, com efeito, têm aparência de sabedoria, como culto de si mesmo, e de falsa humildade, e de rigor ascético; todavia, não têm valor algum contra a sensualidade”

Contudo, é muito fácil desmascara o portador da síndrome da falsa humildade. Sabe como? Quando ele começar a se diminuir concorde com ele. Mas alerto ao leitor que logo você verá a sua verdadeira face! E posso garantir que ela não é nada humilde.

A verdade é que é muito difícil lidar com este pecado. Infelizmente, há várias histórias de líderes que arruinaram muita gente na igreja porque foram dominados pelo orgulho. Ficaram cegos a tal ponto que se tornaram donos da verdade. Começaram a criticar a tudo e a todos sem, todavia, perceberem suas próprias faltas.

Há líderes que, a exemplo de Diótrefes, tornam-se narcisistas e o desejo da primazia se torna tão intenso que acabam por falar mal de outros líderes (ele falava mal do apóstolo João) e a expulsar da igreja aqueles que não são do seu time (cf. 3 Jo 9). João o chama de mau exemplo!

Tendo vistos vários aspectos do orgulho nos vem a pergunta. Como nos proteger deste terrível pecado? Como evitar tamanho mal em nossas vidas.

“A quem queira adquirir a humildade, acho que posso ensinar-lhe o primeiro passo. É compreender que somos orgulhosos …Se pensarmos que não somos orgulhosos é sinal de que, na realidade, somos muito orgulhosos” (CS Lewis).

Creio que o primeiro passo é reconhecer quem é o dono de toda a glória. Na oração do pai nosso lemos: “Teu é o reino, e o poder, e a glória para sempre” (Mt 6:13). Em Isaías também lemos: “Eu sou o SENHOR, este é o meu nome; a minha glória, pois, não a darei a outrem…” (Isaías 42:8). Devemos reconhecer que somente a Deus pertence toda a glória e todo o poder.

Precisamos reconhecer que nada do que temos ou do que somos não nos tenha sido dado pelo Senhor. Seja capacidade, seja inteligência, sejam habilidades, sejam bens etc. Precisamos reconhecer que somos apenas vasos de barro nos quais Deus depositou tudo isto. Reconhecendo esta verdade chegaremos a conclusão de que tudo que somos ou fazemos, o somos e fazemos por que Ele nos capacitou. Então, na verdade, somos apenas instrumentos e sem Ele não somos nada, absolutamente nada! Este é o primeiro passo!

Tendo isto bem claro nas nossas mentes e corações o segundo passo é morrer. Isto mesmo morrer! O leitor já viu um defunto reclamar que o funeral não esteve a altura do seu grau de importância? Alguém já viu um defunto reclamar que o caixão era muito simples? Que a roupa estava apertada? Que não cantaram o seu hino preferido? Que deixaram o caixão cair e ele bateu a cabeça? Que a cova não tinha a profundidade adequada ou que o fogo do crematório estava muito quente? Ou então, alguém já ouviu falar de um defunto que se gloriou pelo grande número de pessoas presentes ao seu velório? Alguém já viu algum defunto gabar-se do número de coroas que lhe foram enviadas ou das importantes autoridades que compareceram no seu velório e sepultamento? Creio que não!

Sabemos que defuntos não reclamam de nada. Não brigam e nem fazem questão de serem honrados. Mortos não se manifestam nem para o bem nem para o mau! Portanto amados, em obediência a Palavra de Deus devemos morrer.

Lemos em Colossenses: “Fazei, pois, morrer a vossa natureza terrena” (3:5a).

Em Romanos lemos: “Porque, se viverdes segundo a carne, caminhais para a morte; mas, se, pelo Espírito, mortificardes os feitos do corpo, certamente, vivereis.” (8:13).

Ainda em Romanos lemos: “sabendo isto: que foi crucificado com ele o nosso velho homem, para que o corpo do pecado seja destruído…” (6:6).

Sabe por que o nosso orgulho nos leva a brigar? Sabe por que nos sentimos ofendidos? Sabe por que nos achamos os tais? Sabe por que discutimos com os outros? É porque ainda não morremos de verdade! A velha natureza ainda não foi mortificada o suficiente. O velho homem desceu da cruz e precisamos crucificá-lo novamente. Precisamos deixar que a obra de Cristo dê um jeito nele! É basicamente por isso!

Irmãos, precisamos morrer para o mundo, mas também precisamos morrer para nós mesmos com nossos desejos de grandeza, de notoriedade, de reconhecimento humano, de sobrepujar os outros etc.

Morto não se sente prejudicado, humilhado, destratado, desvalorizado e não tem o orgulho ferido. É preciso que morramos dia a dia. Todos os dias precisamos mortificar nosso ego e assim iremos morrendo para o orgulho e todos os pecados que dele se derivam.

Um último texto para terminar. Ele se encontra em 1 Pedro 5:6 à Humilhai-vos, portanto, sob a poderosa mão de Deus, para que ele, em tempo oportuno, vos exalte”.

A palavra para humildade no grego é tapeinos (tapeinov”) de onde vem a nossa palavra tapete. O contexto não aponta aos lindos e ornamentados e tapetes de parede. Antes aponta para o tapete que fica a entrada da casa para as pessoas limparem os pés.  Seus significados são: de baixa posição, pobre, humilde, sem valor. O verbo que aparece em 1 Pe 5:6 é tapeinoō (tapeinovw) e quer dizer: rebaixar, tornar baixo.

Então, por mais estranho que possa parecer, neste final de artigo desejo que todos que o lerem possam morrer. Fique em frente a um espelho e diga pra você mesmo: “Morra!”, pois será morrendo que nos tornaremos mais e mais a semelhança do nosso Senhor Jesus e obteremos vitória sobre o orgulho. Ele nos convida a sermos mansos e humildes de coração. Assim sendo, que nesta segunda parte de 2012, e nos anos que se seguirem, lutemos para sermos pessoas melhores e mais humildes.

Que o Eterno, Aquele que se humilhou sobremaneira, nos ajude a imitá-Lo também na auto-humilhação!

Amém!!

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